terça-feira, 9 de outubro de 2012

CARTA DE NAHUEL MORENO À DIREÇÃO DE ALICERCE


Começou a revolução brasileira?
Buenos Aires, 11 de maio de 1984
À direção de ALICERCE

Estimados camaradas:
Impactados pelos acontecimentos que comovem vosso país, resolvemos seguir diariamente a situação e ler, enquanto cheguem, vossos documentos. Pensamos assim colaborar com vocês, ainda mais do que vínhamos fazendo, na elaboração de vossa política.
Lemos os seguintes materiais: os dois últimos jornais, o documento de 28 de abril e o boletim Interno nro.17 de 3 de maio. Acreditamos que vossa análise da situação pode sintetizar-se esquematicamente em três pontos (vocês dirão se estamos enganados):
Primeiro: definem a situação como revolucionária a partir do "gigantesco comício de um milhão de pessoas no Rio de Janeiro pela campanha das diretas". Completam e precisam esta definição com outra: não houve crise revolucionária. Esta crise, da mesma forma que a queda do governo, o triunfo da Emenda no Parlamento e a greve geral, estiveram a centímetros de dar-se, puderam concretizar-se, mas não se deram porque as direções traíram a greve geral. 
Segundo: para vocês, quem saiu triunfante da votação no Parlamento, desgastado, em crise mas triunfante, foi o governo ("foi uma vitória do governo à custa de um desastre brutal e sem poder reverter a etapa revolucionária", pág. 2-doc. 28/04/84). A conclusão é óbvia: neste confronto saiu derrotado o movimento de massas. Não foi uma derrota histórica, não modificou a situação revolucionária, mas uma derrota conjuntural é uma derrota. .
Terceiro: a derrota das massas e o triunfo do governo não têm maior importância, porque os trabalhadores e o povo deram um salto colossal na sua consciência política, como o demonstra a vaia a Brizola. Não se esqueçam que estou esquematizando e que existe certa imprecisão e confusão nos vossos documentos, plenamente justificadas porque faz pouco tempo que os acontecimentos se produziram.
Esta carta tem o objetivo de colocar-lhes nossas dúvidas, principalmente quanto a estas três caracterizações. Vamos por ordem.

A partir da manifestação do Rio se abriu uma crise revolucionária?

Nossa primeira dúvida está sintetizada no subtítulo. Vocês definem a situação como revolucionária; nós suspeitamos que desde a manifestação do Rio até a votação no Parlamento se abriu uma crise revolucionária. Vocês definem o que aconteceu da seguinte maneira: “o governo perdeu completamente o controle da situação, uma imagem característica de uma etapa revolucionária" (Doc. já citado, pág. 1). Justamente, para nós o que caracteriza uma crise revolucionária é que o governo perde ... "completamente o controle da situação". Nossa hipótese é de que as eleições estaduais de 82, nas quais o governo foi derrotado, abriram a crise deste, que se combinou com a crise econômica para inaugurar uma situação revolucionária. Esta, a partir da colossal e histórica manifestação do Rio, deu um salto à crise revolucionária. A votação no Parlamento fechou esta crise com uma colossal derrota do governo, não com seu triunfo, com uma vitória histórica do movimento de massas, não com a sua derrota.

Nova luz sobre a discussão

Com os companheiros de direção de vosso partido que nos visitaram, tivemos uma discussão mais de forma que de fundo. Os companheiros mantinham que a situação do ano passado, e de fato no começo deste ano, era pré-revolucionária; nós, que era revolucionária. Conseguimos uma fórmula de acordo: estava se passando de pré a revolucionária. Vocês dizem no documento que o que aconteceu demonstra que esta definição foi correta, porque recentemente, nas últimas semanas, a partir do Rio, passamos a situação revolucionária.
Suspeitamos que, tanto na discussão anterior, como na que se abre agora entre nós, sobre a caracterização da situação atual, existe mais que uma discussão de forma. Possivelmente o nó da questão está em não ter precisado bem as definições de situação e crise revolucionária. Se assim fosse, as discussões do ano passado sobre se a situação já era revolucionária ou não, adquirem nova luz. Isso é o que vamos tratar de provar.

As diferentes situações

Tudo o que dissermos sobre crise e situação revolucionária e pré-revolucionária são tentativas, já que são conceitos que estamos elaborando e reelaborando. Tem a ver com muitos fenômenos que se deram neste pós-guerra (e possivelmente na própria guerra mundial), sobretudo com as revoluções democráticas e/ou de fevereiro triunfantes.
Tínhamos para arrancar, duas definições de situação revolucionária. A de Lenin: "Os de cima não podem e os de baixo não querem". A de Trotsky, que dá quatro condições que a caracterizam: primeiro, uma crise muito aguda da burguesia; segundo, giro massivo da pequena-burguesia contra o regime; terceiro, vontade e organização revolucionária do movimento operário; quarto, a existência de um forte partido marxista revolucionário que dirija as massas e esteja firmemente disposto a tomar o poder (me limito a resumir a definição de Trotsky, em repetir citações que já demos em outras oportunidades). Situação pré-revolucionária foi definida por Trotsky seguindo o mesmo método e partindo de sua definição da revolucionária. Para ele a situação pré-revolucionária era igual à revolucionária menos o quarto fator, que era a existência de "um forte partido marxista revolucionário que dirija as massas e esteja firmemente disposto a tomar o poder", como resumimos nas linhas anteriores. A caracterização de situação pré-revolucionária era quando se davam as três primeiras condições da definição de situação revolucionária: “primeiro, uma crise muito aguda da burguesia; segundo, o giro massivo da pequena-burguesia contra o regime; terceiro, vontade e organização revolucionária do movimento operário”.
Mas, como já dissemos muitas vezes, neste pós-guerra triunfaram muitas revoluções, não só situações revolucionárias, sem maior influência da classe operária e sem que esta acaudilhe como classe o processo revolucionário (a terceira condição de Trotsky).
Tampouco se deu nenhum triunfo revolucionário que tenha sido dirigido por um partido marxista revolucionário (a quarta condição de Trotsky).
Os setores mais dinâmicos de quase todas as revoluções triunfantes nas últimas décadas, começando pela China, foram o campesinato ou setores urbanos não proletários, por um lado. Por outro, os partidos que dirigiram foram pequeno-burgueses e/ou burocráticos, desde Fidel Castro até Mao Tsé Tung.
Estes fatos nos levam, há alguns anos, a colocarmos a necessidade de encontrar outras definições das situações revolucionárias e pré-revolucionárias. Acreditamos estar perto da solução do problema: as duas primeiras condições de Trotsky (a crise burguesa e o giro da pequena-burguesia contra o regime dominante), algumas vezes foram suficientes para dar origem a situações revolucionárias, umas traídas por suas direções e outras, apesar destas, que levaram ao triunfo da revolução.
Se tivéssemos que sintetizar esta nova definição nos encontraríamos com a velha fórmula leninista: "existe uma situação revolucionária quando os de cima não podem e os de baixo não querem".
Se esta definição é correta, volta a colocar a necessidade de dar uma. Nova de situação pré-revolucionária, por uma razão de peso: as condições da situação revolucionária tal qual acabamos de defini-la tem um condicionamento a menos que a velha. definição de Trotsky de pré-revolucionária, já que não foi imprescindível que a classe operária fosse a vanguarda e a direção para o triunfo da revolução. Como definir então as situações pré-revolucionárias que se deram neste pós-guerra, as que antecederam as situações ou aos triunfos revolucionários?
Um primeiro elemento para conseguir avançar na definição é que tem que ser com menos condicionamentos do que os que acostumamos a dar para definir a situação revolucionária. Dito de outro modo, tem que ser menos que "uma tremenda crise do regime e um giro massivo da pequena-burguesia contra o regime". Partindo deste raciocínio, acreditamos que podemos dar duas definições provisórias (insisto no provisório, porque aqui estamos elaborando todos os dias): uma genérica, é um passo intermediário de uma situação contra-revolucionária ou não-revolucionária a uma revolucionária; outra estrutural, uma colossal crise política e econômica do regime. Talvez também caiba a de um giro massivo da pequena-burguesia à revolução, ainda que não haja uma colossal crise do regime.
Voltando a Lenin, diríamos "é quando os de cima já não podem, e se podem os de baixo não querem".

Situação e crise revolucionária
É nossa opinião genera1izada que no Brasil faz já por volta de um ano que "os de cima não podem e os de baixo não querem". Concretamente, faz mais de um ano que o regime de Figueiredo está em crise política e o regime capitalista brasileiro está em crise econômica. Ambas as crises têm sido cada vez mais agudas e, ao mesmo tempo, há um giro cada vez mais massivo da população para a oposição e enfrentamentos ao regime de Figueiredo. Por isto definimos a situação como revolucionária porque se só houvesse uma crise do regime seria pré-revolucionária.
Vocês definem situação revolucionária "quando o governo perde totalmente o controle da situação". Se ocorre, como ocorreu neste último ano no Brasil, que existe uma crise brutal do regime e a população se volta massivamente contra ele, mas o governo não perdeu ainda o controle total dos acontecimentos, para vocês não há situação revolucionária. 
Para nós sim.
Esta diferença se transfere à questão da crise revolucionária. 
Para nós, quando "se perde o controle da situação" não estamos simplesmente ante uma situação revolucionária, mas ante uma crise revolucionária. E isso é o que ocorreu desde a manifestação do Rio de Janeiro.
Segundo a vossa descrição, depois da votação no Parlamento, o governo saiu muito pior que antes da votação e que antes da mobilização. Se fossem conseqüentes, deveriam escrever que o governo "continua perdendo o controle da situação". Mas se a todo o processo que vai desde a manifestação do Rio até o presente, o definem como "situação revolucionária", não vão encontrar nada que se possa definir como crise revolucionária. Porque precisamente, crise revolucionária é quando se perde totalmente o controle da situação. 
Justamente por isso não pode durar muito tempo, semanas ou, no máximo, dois ou três meses. Ainda que seja possível que tenhamos também que modificar esta afirmação e que haja crises revolucionárias muito prolongadas, talvez como o que está acontecendo na Bolívia.

A revolução começou no Rio de Janeiro

Opinamos que a partir da grande manifestação no Rio houve no Brasil uma crise revolucionária. Esse dia, para usar a famosa frase de Trotsky referindo-se à greve geral com ocupação de fábricas na França, "começou a revolução brasileira". Como vocês podem ver, encontramos um paralelismo muito grande entre Brasil e Argentina, embora com um ritmo muito mais veloz em vosso país.
A partir da manifestação do Rio, começa a derrota do governo. Este sofre uma série de reveses - incluindo a própria votação, à qual nos referimos mais adiante - que o deixam destroçado.
Não sei se já se pode falar que o governo já foi derrotado, apesar de que suspeito que o foi. Usando uma fórmula muito cautelosa, que para mim é pouco em relação a realidade, como mínimo temos que dizer que a revolução triunfou na votação parlamentar.
O que vocês mesmos descrevem aponta neste sentido. Se situação revolucionária é quando se perde completamente o controle da situação, se essa situação se abriu a partir da manifestação do Rio, se depois da votação parlamentar essa situação é cada vez pior para o governo... isso significa que o governo perdeu o controle da situação de forma completa, absoluta, impressionante. Que nome damos a esse processo? .

Um esquema no lugar da realidade

Vocês aplicam um esquema à realidade e, como esse esquema não se dá, negam a realidade. Para vocês, crise revolucionária e triunfo da revolução era: greve geral, triunfo das diretas no parlamento e queda de Figueiredo. Não houve greve geral, não triunfaram as diretas no parlamento, não caiu Figueiredo. Portanto, para vocês não houve crise revolucionária nem triunfo da revolução, mas sim triunfo do governo.
Está claro que o ideal teria sido que ocorresse dessa maneira. Porém, esta seqüência ótima é justamente o que não se deu. O que não significa que, porque o nosso esquema não se deu, tenha sucedido exatamente o contrário: triunfou o governo e as massas foram derrotadas.
Uma vez mais lhes dou o exemplo de que tanto gostamos, da luta de boxe. O ideal, o ótimo seria que nosso boxeador ganhasse no primeiro round, no primeiro minuto da luta, por destruição física e nocaute do adversário. Nosso boxeador tem todas as condições para conseguir esse triunfo categórico mas, o diretor técnico, vendido ao adversário, evita com suas instruções traidoras o triunfo no primeiro round, mas não pode impedir que lhe dê uma surra. Portanto, o ótimo não se deu, mas é muito bom e saudável que nosso boxeador consiga impor outro esquema: primeiro round, ele dá uma surra no adversário; segundo round, lhe incha um olho e lhe tira sangue no nariz; terceiro round, lhe arrebenta uma costela; quarto round, o deixa "grogue".
Que definição daríamos da situação ao finalizar o quarto round? Se somos esquemáticos, diremos que o boxeador inimigo triunfa, porque o nosso não conseguiu, por culpa do diretor técnico, ganhar por nocaute no primeiro minuto do primeiro round. Mas a realidade seria o oposto: o adversário está recebendo uma tremenda surra e o nosso está ganhando de longe. .
Esta comparação serve para aclarar as contradições que existem entre a descrição que vocês fazem da situação e a definição a que chegam. Vocês mesmos dizem que Figueiredo saiu de seu aparente triunfo arrebentado, destruído, com uma crise cada vez mais aguda. E agregam que as massas avançaram muitíssimo subjetivamente: cada vez odeiam mais ao governo e ao Congresso, vaiam a Brizola, etc., ou seja, saem com um sa1do a seu favor. A descrição que vocês mesmo fazem é a de um boxeador, Figueiredo, que recebeu uma grande surra e outro boxeador que se sente cada vez mais forte e confiante, o movimento de massas. Mas essa pintura ou descrição só pode explicar-se se este último boxeador, embora não tenha destruído o seu inimigo no primeiro round, vem ganhando contundentemente um round atrás do outro.
É muito perigoso querer aplicar esquemas à realidade, em lugar de partir de um estudo objetivo da própria realidade para ver de que forma específica se dão nela as nossas definições. Na Argentina, por exemplo, houve uma grande discussão porque muitos companheiros opinavam que, como continuava governando um General, não havia acontecido nada, não havia acontecido crise revolucionária, nem havia situação revolucionária. Com o que aprendemos da Argentina, possivelmente se Figueiredo tivesse caído, embora sem greve geral, vocês teriam acertado em definir a situação e a crise. Mas como tampouco se deu o "esquema argentino", como continua Figueiredo e não outro militar, existe o perigo de que vocês confundam tudo: não houve crise revolucionária, Figueiredo não perdeu mas ganhou, etc.
Para nós é evidente que perdeu. Que saiu destruído de cada choque com o movimento de massas. E que a discussão é se somente está "grogui" ou, como é nossa impressão, seus homens já o abandonaram ou o árbitro parou a luta, ou seja, já perdeu, não por nocaute mas por nocaute técnico ou por abandono.

O fetichismo da greve geral
Nos parece que vocês fazem um fetiche da greve geral. De vossa análise se desprende que as Diretas não foram votadas e Figueiredo não caiu porque as direções traidoras frearam a greve geral.
É verdade que com uma greve geral quase seguramente caía Figueiredo e se votaria a emenda. Mas a relação não pode ser mecânica, não podemos dizer que era absolutamente seguro. O que sim é seguro é que com uma greve geral o governo teria ficado muito mais fraco e o processo revolucionário muito mais forte. Este processo teria dado um salto e, se obtivéssemos um triunfo, esse triunfo seria hoje muito mais categórico. Também é verdade que a greve coloca de forma imediata o problema do poder.
Mas fazer fetiche de greve geral, como fazem os sindicalistas revolucionários, é muito perigoso. A greve geral é uma ferramenta colossal do processo revolucionário, mas este não começa nem termina com ela. A greve geral é um método e uma consigna a mais, de enorme importância, evidentemente, do processo revolucionário.
No Brasil, como em muitos outros países, em vez de greve geral houve algo igualmente importante: uma manifestação de um milhão no Rio e outra de um milhão e meio em São Paulo. As duas manifestações foram enormes alavancas da luta de classes. O que é preciso discutir é se essas duas manifestações derrotaram o governo, embora, devido às direções burguesas e burocráticas do movimento operário, esses triunfos aparecem mediados, distorcidos.
Não entendemos porque vocês fazem uma diferença tão absoluta entre greve e mobilização nas ruas: se existe greve geral, tudo muda; se não há greve geral, ainda que haja grandes manifestações que modifiquem a situação, o governo continua triunfando. Às vezes as manifestações têm um êxito igual ou superior ao da greve geral. Por outra parte, a greve pode fracassar porque não está bem preparada, ou triunfar e ser traída. O Xá do Irã caiu fundamentalmente pelas mobilizações nas ruas, que se combinaram com a greve, mas as manifestações massivas cada vez mais imponentes foram o elemento determinante. Nos Estados Unidos não houve nenhuma greve geral, mas as grandes manifestações provocaram um dos giros mais espetaculares da luta de classes quando obrigaram ao imperialismo norte-americano a retirar-se do Vietnã, sofrendo a primeira derrota militar da sua história.
Acreditamos que as manifestações do Rio e de São Paulo - acompanhadas pelo resto das cidades - tiveram o efeito de uma greve geral triunfante. Significaram o começo da derrota do governo e uma vitória colossal do movimento de massas. E que essa derrota e essa vitória se manifestaram na própria votação parlamentar.

A derrota do governo e o triunfo das massas no Parlamento

Com relação à votação da emenda, acreditamos que vocês voltam a aplicar um esquema e por princípio de identidade: aprovação da emenda é igual a triunfo das massas e derrota do governo; não votação da emenda é igual a derrota das massas e triunfo do governo. Mas a primeira verdade não implica que o oposto é verdadeiro: se bem é certo que a aprovação da emenda era um triunfo completo evidente das massas, não o é o fato de que se não fosse aprovada era necessariamente uma derrota das massas e um triunfo do governo.
Esta análise simplista e por princípio de identidade (se A é igual a B, não A é igual a não B), lhes impediu ver o que havia acontecido na realidade com o mecanismo eleitoral concreto. Não perceberam que esse mecanismo eleitoral expressou distorcidamente o colossal triunfo do movimento de massas e a derrota do governo.
Se há, por exemplo, uma votação no Senado, onde a terceira parte é biônica, e para ganhar é necessário dois terços dos votos, e "só" se conseguiu 60%... Quem ganhou e quem perdeu? De acordo com vocês, ganhou o governo, porque não se conseguiu os dois terços dos votos. Mas uma análise concreta, marxista, indicaria que é uma derrota total do governo - ainda que não tenha triunfado a moção da oposição - porque esses 60%, se tiramos os biônicos, expressa que no mínimo uns 85% da população está contra o governo o que se demonstra muito distorcidamente no fato de que perto de 90% dos senadores eleitos, não biônicos, votaram contra o governo.
Algo parecido aconteceu na Câmara de Deputados. A emenda não foi aprovada não porque uma grande quantidade de deputados votasse a favor do governo, mas pelo contrario: só uma pequena minoria dos deputados votou a favor do governo, enquanto uma maioria esmagadora votava contra.
O fato espetacular que vocês não medem em toda a sua importância é que a votação divide duas épocas na política brasileira. Antes da votação havia dois blocos políticos no país. Depois da votação se rompeu para sempre o bipartidarismo. Entre os deputados não houve dois blocos mas três: um opositor ao governo, amplamente majoritário; outro que continua alinhado junto ao governo, esmagadoramente minoritário; e um terceiro bloco, constituído por um alto número de deputados, que fugiu da Câmara para não votar nem a favor nem contra.
O surgimento deste bloco centrista é um elemento determinante da nossa análise da nossa análise da votação. Porque era governamental e deixou de sê-lo. Ainda que não tenha chegado a votar com a oposição contra o governo, essa é sua dinâmica. Precisamente por isso, a emenda, apesar de conseguir uma amplíssima maioria na Câmara, não conseguiu os dois terços que poderia dar-lhes o triunfo. Mas o fato de que tantos seguidores do governo tenham rompido com ele é a expressão superestrutural de que está totalmente em crise.
A votação deixou o governo completamente no ar. Ficou demonstrado que perdeu quase todo o apoio que ainda tinha nas últimas eleições e que se reflete em que o bloco governamental de deputados é, hoje, o terceiro bloco em influência. Agora o seu destino depende de para onde vai o novo setor centrista que, se se junta com a oposição, pode dar-lhe jaque mate. E isso o obriga a negociar de forma imediata, sem nenhuma garantia de que possa impor nada nessas negociações. A votação, ao deixá-lo em esmagadora minoria e provocar a ruptura do seu bloco, de fato liquidou o governo, expressando na superestrutura e de forma distorcida o triunfo que o movimento de massas havia conquistado nas ruas.

Não coloquemos datas às revoluções por enquanto

Este método de tratar de aplicar esquemas à realidade chega a extremos um pouco graves no caso de vocês. Dizem, por exemplo, que "a forma assumida, de votação da emenda, marcaram uma data para a revolução do Brasil, ao contrário da Argentina e Bolívia" (Doc. de 28 de abril, pág. 2). Tememos que, para vocês, a revolução só podia explodir numa data fixa, que era o dia da votação da emenda. De tudo o que dizem, se desprende também que era uma data fixa para a greve geral.
Dito de outro modo, para vocês a revolução só se podia dar no dia da votação da emenda e com uma greve geral. Como isso não aconteceu, a revolução não se deu.
Faço um alerta sobre este método errado. Isso de impor datas e normas à revolução expressa uma aspiração, um desejo: derrubar o adversário no primeiro round. Mas não serve. Nos impede de ver a realidade, o ritmo próprio da luta de classes e, portanto, adequar a ele nossas palavras-de-ordem e nossa política.

.As perspectivas imediatas

Este intercâmbio de opiniões sobre a definição da situação brasileira não são inúteis: delas surgem os prognósticos sobre a perspectiva imediata.
Da caracterização que fazem, vocês tiram um prognóstico correto: é quase certo que vai continuar a crise do governo. Mas, agregam, não está descartado que se dê uma situação como a chilena, com um Pinochet que resiste aglutinando ao seu redor os setores mais duros e reprimindo violentamente o movimento de massas, embora não seja a perspectiva mais provável
De nossa análise, em troca, surge claramente que não se pode dar no Brasil nada parecido ao Chile. Pinochet resiste violentamente porque ainda não foi derrotado. A situação brasileira superou amplamente a chilena pelo avanço da revolução. Para nós, a ditadura já foi derrotada ou está a caminho de sê-lo inexoravelmente, a partir das manifestações e da votação parlamentar.
Deixemos de lado, no momento, se isto significa que já caiu. Estas duas derrotas fizeram com que a situação escapasse totalmente das mãos do governo e que este se veja obrigado a negociar.
Por isso insistimos em que a situação era igual a da Argentina, mas muito mais dinâmica. A atual etapa no Brasil é similar a da Argentina quando entrou em crise Galtieri e se discutia a sucessão. Os militares estão negociando com os partidos burgueses e a burocracia para ver como assimilam a derrota do governo e para evitar que o movimento revolucionário das massas continue se desenvolvendo. Estamos na etapa da negociação com a "Multipartidária". Por isso acreditamos que vai primar a negociação, e com um objetivo bem preciso: como se dosifica a derrota do governo.
Esta discussão, se nós temos razão, tem muito a ver também com a moral da classe operária. É diferente dizer-lhe que saiu derrotada ou dizer-lhe que conseguiu muito, inclusive a derrota do governo, se isto for verdade, já que o feio seria mentir-lhe. Se se acerta que suba um presidente negociado para que chame as diretas dentro de um ou dois anos, é preciso dizer aos trabalhadores que essa é uma conquista colossal que eles obtiveram com suas mobilizações nas ruas. E, ao mesmo tempo, que estão tratando de roubar-lhes ou administrar-lhes esse grande triunfo, utilizando para isso a traição da burocracia sindical e dos partidos burgueses.
Devemos explicar às massas que com esta conquista revolucionária fizeram voar pelos ares todos os planos da ditadura, que pretendia continuar seis anos mais (um ano que lhe falta a Figueiredo mais cinco anos de um novo mandato). E que o governo não controla absolutamente nada.

As palavras-de-ordem e o programa

Esta discussão não é inútil, já que tem importância para precisar nossa política. Se não me engano, a partir da votação no parlamento, vocês incorporaram várias novas palavras-de-ordem no vosso programa: Não à negociação-traição; não à postergação da greve geral para quando se discuta a emenda Figueiredo; greve geral agora para derrotar o governo e conseguir as diretas. Estas palavras-de-ordem são a expressão de vossa política atual: atacam com virulência aos partidos burgueses opositores por querer negociar com o governo uma saída e não continuar lutando pelas diretas; denunciam a burocracia sindical por seguir os partidos burgueses e por postergar o chamado à greve geral para uma data indefinida, o dia da nova votação no Parlamento. Exigem da burocracia que fixe uma data imediata para a greve.
Por estar imersos nos acontecimentos, não tiveram tempo de ver como se ligam vossas novas palavras-de-ordem com a análise da situação.
Temos a impressão de que caíram um pouco no empirismo, levantando palavras-de-ordem sem clarificar suficientemente a situação e os resultados da votação no Parlamento.
Vemos uma contradição entre vossa análise da situação e vossa política atual. A chave do nosso programa e palavra-de-ordem deve partir da resposta a uma simples pergunta: desde a eleição parlamentar, a etapa mudou ou não? Para nós sim, de situação revolucionária pré-triunfo a pós triunfo. Para vocês não, já que tudo continua igual ou pior com a vitória "de Pirro” do governo.
É aqui onde aparecem graves contradições entre vossa análise, vossa definição implícita de que não há uma nova etapa superior provocada por um triunfo do movimento de massas, e vossa política e palavras-de-ordem. Estas são para uma etapa diferente e não para a mesma etapa, quando fazem centro na denúncia das negociações, na traição das direções, colocando greve geral para diretas já. Isto significa que não houve nenhuma derrota mas um colossal triunfo, ou vocês são uns irresponsáveis que propõem a greve geral de forma imediata depois de uma vitória do governo. É preciso saber se vocês estão contra umas negociações que se fazem para aprofundar uma derrota (então não cabe Greve Geral já!), ou para dosificar o triunfo (então sim cabe a greve geral para o dia seguinte).
Porque, se como vocês dizem o governo triunfou no Parlamento, tem razão a burocracia em adiar o enfrentamento com aquele para uma data mais distante e é correta sua linha de derrotar primeiro a contra ofensiva de Figueiredo. Se houve triunfo do governo, existe inevitavelmente uma contra ofensiva do mesmo. Justamente, essa deve ser a explicação que dão a burguesia opositora e a burocracia: fazemos o que pudemos para triunfar na votação, mas, infelizmente, o governo conseguiu nos derrotar, embora mora1mente triunfou o povo. Aproveitemos esse triunfo moral para pactuar com o governo. A burocracia pode utilizar argumentos mais sofisticados, como a "traição da oposição” e variantes pelo estilo, para chegar à mesma conclusão: "de imediato não se pode fazer nada”. Um bom 'marxista trata de ver a realidade tal como ela é. Se na votação parlamentar houve um tropeção objetivo do movimento de massas, a grande tarefa é frear o governo e recuperar-nos do mesmo. Se assim fosse, a burocracia com seus m6todos equivocados está certa e não podemos denunciá-la como traidora, mas sim por uma condução burocrática de uma posição correta: adiar a greve geral.
Nós acreditamos que as palavras-de-ordem que vocês levantam hoje são um tremendo golaço, mas só têm base de sustentação na nossa análise: as massas com sua mobi1ização obtiveram uma vitória atrás da outra, e a última foi a votação no Parlamento, o que mudou a etapa. É necessário continuar com a mobilização e não detê-la para negociar. Um empurrãozinho mais e não ficam nem rastros da ditadura militar.
Se nossa definição de que a revolução já começou no Brasil ou que a revolução democrática já triunfou é correta; se o governo já foi derrotado ou sua derrota já começou, são necessárias novas políticas, programa e palavra-de-ordem. De forma empírica, vocês refletem esta necessidade ao levantar essas novas palavras-de-ordem que já comentamos. Mas isto não é suficiente. Uma nova etapa requer um novo programa.
Para nós, o programa para esta nova etapa tem vários eixos. O primeiro e fundamental é que deixa de ser ou começa a deixar de ser o eixo do nosso programa o "abaixo a ditadura e diretas já". Começam a ter muito maior peso as palavras-de-ordem diretamente de transição, de tipo econômico e político. Estamos assentados sobre duas políticas que é preciso combinar, mas superando a velha. O maior peso do nosso programa atual passa a ser nossa proposta positiva de governo. E essa palavra-de-ordem central não pode ser outra que governo do PT e das duas centrais operárias. Até a votação no Parlamento, nossa proposta era greve geral para conseguir as diretas e derrubar o governo. Agora é preciso mudar radicalmente e o chamado à greve geral é preciso ser feito como tática para conseguir a grande palavra-de-ordem estratégica de governo do PT e das centrais sindicais.
Como sempre, toda definição nova e todo novo programa os formulamos em base ao nosso método de tratar de prever a possível perspectiva dos futuros acontecimentos. Assim como no ano passado insistimos em que havia que deixar em segundo plano a palavra-de-ordem frontal de "abaixo o governo" pela de "Diretas já", porque por esta última ia passar a luta e as mobi1izações de massas contra o governo, hoje devemos fazer um prognóstico parecido. As massas irão abandonando ou já estão em vias de abandonar, a luta pelas diretas. O mesmo vai começar a acontecer com a luta por derrubar Figueiredo. Isto se deve a duas razões: a primeira é que mudou a etapa com a derrota total do governo; a segunda é a traição das direções, que vão imbuir as massas de que o que se conseguiu é suficiente, que a ditadura está liquidada a prazo fixo, que em dois ou três anos haverá eleições diretas para presidente e não em seis, como queria a ditadura. Que o próximo presidente se comprometeu com um interregno democrático. As massas, a contragosto ou não, vão aceitar esta situação. Porque um fator decisivo da multitudinária mobilização pelas diretas foi o fato de que todas as direções burguesas e operárias opositoras terminaram chamando à mobilização. Sem esse chamado a mobilização teria sido mais fraca e dificilmente se teria derrotado o governo. Hoje as direções se conformam com o triunfo alcançado, lhes parece suficiente e agora vão chamar à tranqüilidade. Este também é um novo fato da realidade de importância decisiva. Por isso chamam a greve para as calendas parlamentares. Por isso nossa palavra-de-ordem central de governo do PT se torna ultrapropagandística, já que não está aberta uma combinação de circunstâncias tão favorável, como na etapa anterior, que nos permitia definir uma palavra-de-ordem mobilizadora de caráter nacional.
Temos que levar ao primeiro plano a luta contra a crise econômica, as demissões e a miséria. Devemos centrar o ataque no regime político e econômico, priorizando o nosso velho programa transicional. E unir tudo isso à palavra-de-ordem de governo do PT e das centrais sindicais, e a uma política de chamamento e pressão sobre as direções políticas e sindicais da classe operária.
A outra palavra-de-ordem central da etapa continua sendo a de greve geral enlaçada com poucas reivindicações. Nesta etapa acreditamos que com as salariais ou contra o FMI e pelo não pagamento da dívida.
É preciso estudar como se combinam estas palavras-de-ordem de governo operário com a de assembléia constituinte. Também é preciso ver (não conheço a legislação brasileira) se não devemos levantar: fora os biônicos do Senado!  Renuncia imediata dos biônicos! Eleições diretas sem biônicos! Esta poderia ser uma palavra-de-ordem intermediária entre Assembléia Constituinte e Diretas para Presidente, já que seria Eleições diretas para todos os senadores! Seria uma palavra-de-ordem separada da Constituinte e de aplicação imediata de grande importância e muito simples de explicar ao movimento de massas. Poderia adquirir importância se, como eu creio, a burguesia for acertando a questão das diretas colocando-lhe uma data fixa a dois anos ou algo pelo estilo.

O nível de consciência das massas

Tenho a impressão de que vocês, assim como diminuem os êxitos objetivos do movimento de massas e a derrota do governo, são exageradamente otimistas no terreno subjetivo, quanto ao avanço de sua consciência. Vocês acreditam que as massas já odeiam ao Congresso e aos dirigentes burgueses opositores. Sublinham, por exemplo, que as massas vaiaram a Brizola porque não estava a favor da greve geral.
Estamos completamente de acordo em que as massas não acreditam mais no governo. É um avanço quantitativo, porque já antes não acreditavam nele. Mas ainda que vocês não o digam, se deduz que opinam que houve um avanço qualitativo na consciência das massas com relação aos organismos e partidos burgueses; repudiam o Congresso, um milhão de pessoas vaiam a Brizola; rompem de fato com as instituições e direções burguesas “democráticas” e continuam avançando em direção a um grande partido de massas, de tipo classista. No documento dizem: “o PT e a CUT têm influência de massas (ou estão em vias de transformar-se). (pág. 5). No Boletim Interno posterior avançam mais: "é bastante provável que o PT passe a ter um peso de massas espetacular a partir daí (já é de massas neste momento e ampliará qualitativamente a sua influência)". O fato de que tenham avançado praticamente até o final em poucos dias, indica que vossa posição é cada vez mais coerente.
Nós temos algumas dúvidas de que o salto na consciência das massas seja tão espetacular. Acreditamos que deram um salto importante, mas não até o grau de repudiar massivamente aos partidos e instituições da democracia burguesa (...).
Bom, camaradas, espero que nossas observações lhes sirvam para algo, e que nos demonstrem que quem está errado somos nós, se não os convencermos. Enquanto isso, saibam que acompanhamos vossa intervenção, desenvolvimento e luta por construir um grande partido com influência de massas, com admiração.
Saudações fraternais trotskistas
Nahuel




Minuta sobre Economía mundial -- parte 2


III. El “catastrofismo” o la “teoría del colapso”

 

Al analizar las perspectivas de la crisis, algunas corrientes retoman la teoría de la catástrofe inevitable del capitalismo, como resultado del desarrollo in extremis de la tendencia decreciente de la tasa de ganancia y de otras leyes señaladas por Marx, teoría que existe desde el siglo XIX. En una obra más reciente, Génesis y estructura del Capital (1989), Roman Rosdolski la considera una de las conclusiones centrales de Marx.

 

Entre sus defensores actuales está el PO argentino: “El capitalismo es un modo de producción históricamente condicionado y, por lo tanto, condenado a agotarse como consecuencia de sus propias contradicciones. (…) Marx concibe, pues, el desarrollo capitalista como un proceso plagado inevitablemente de movimientos catastróficos. (…) El capitalismo revela una tendencia inevitable a su derrumbe, creando así las condiciones necesarias para su superación.”[1]

 

Como el capitalismo marcha inevitablemente hacia “su derrumbe”, cada crisis es sólo un nuevo “movimiento catastrófico” en esa dirección. En este sentido, resulta secundario estudiar los cambios que se producen en su interior y las características específicas de cada crisis.

 

Nahuel Moreno criticó duramente esta concepción calificándola de “milenarista”[2]. Su principal falla conceptual es que se basa en un análisis económico “puro” totalmente desligado de los procesos de la lucha de clases. El sistema capitalista imperialista está llevando a la humanidad a niveles cada vez mayores de destrucción y, en este sentido, a mayores “catástrofes”. Es posible también que esta crisis sea mucho más fuerte que la de la década de la década del 90 o la de 2001-2002. Pero, como la experiencia histórica ya ha demostrado, no caerá por sí mismo, por el peso de sus “tendencias inevitables”, si no es derrotado y destruido por la revolución socialista mundial.

 

Por eso, cómo va a incidir una determinada crisis económica en esa perspectiva estratégica, es decir, si nos acerca o nos aleja de ella, no es algo que se definirá en el terreno de la “economía” sino en el de la lucha de clases. Especialmente, la existencia o no de una dirección revolucionaria o la posibilidad de avanzar en su construcción. No es casual que Trotsky plantee en el Programa de Transición la cuestión más objetiva (“las fuerzas productivas han cesado de crecer”) junto con la más subjetiva (“la crisis de la humanidad es la crisis de su dirección revolucionaria”).

 

NM desarrolla esta idea en su “ley de inversión de los factores de causalidad”: los procesos ocurridos en la época imperialista, sean políticos o económicos, sólo pueden analizarse considerando como cuestión central el problema de la dirección. Sobre esta base, explica, por ejemplo, que el boom económico de posguerra sólo puede entenderse por las traiciones del estalinismo.         

 

IV. El papel de China

 

En una visión opuesta, Chesnay y otros autores analizan el gran cambio estructural que significó la restauración capitalista en los ex estados obreros, especialmente en China. Esto le permitió al capitalismo recuperar directamente esos grandes mercados y, especialmente, generar un nuevo polo de producción y extracción de plusvalía en Asia (China + Corea del Sur + los “tigres”), que se transformó, primero, en un potente dinamizador de la economía mundial y, luego, en un potencial “competidor” de los imperialismos tradicionales. Esto abriría la posibilidad de que ese polo sea el “motor alternativo” de la economía mundial evitando, o al menos amortiguando, la caída en una crisis mundial generalizada. 

   

El fondo del debate, entonces, es la definición de qué tipo de país es China y su posible papel actual. A diferencia de años anteriores, cuando muchos autores sostenían que aún era un estado obrero, hoy ya es bastante generalizada la opinión de que se ha restaurado el capitalismo. Por eso, la discusión actual es si China ya es una gran potencia capitalista, o va en rápido camino de serlo, como sostienen diversos analistas burgueses y autores como Chesnay o si, por el contrario, sigue siendo un país atrasado transformado en la mayor semicolonia mundial del imperialismo, especialmente el estadounidense, como sostenemos nosotros y otras organizaciones.   

 

Chesnay parte de varios hechos objetivos: desde la década del 90, China ha tenido las mayores tasas mundiales de crecimiento económico; en 2007, alcanzó el tercer lugar en la lista de PIBs nacionales y se ubicó como el mayor exportador y el tercer importador mundial. Él analiza que este crecimiento fue impulsado básicamente por las inversiones extranjeras, con el objetivo de aprovechar las ventajas que ofrecía el estado chino y los bajísimos salarios que permitían la extracción de una gigantesca masa de plusvalía. Esto no sólo sostuvo la acumulación mundial de los últimos años sino que también ayudó a presionar la baja de los salarios industriales en EE.UU. y Europa. De esta forma, China se fue convirtiendo en la “fábrica del mundo” con un modelo de crecimiento que él denomina “arrastrado por las exportaciones”.

 

Hasta aquí, ninguno de los elementos señalados sería contradictorio con una caracterización de semicolonia. Pero Chesnay se encarga de aclarar este punto:

 

“Hemos subrayado el rol de las inversiones de grupos industriales estadounidenses y (…) también de los grupos industriales japoneses que la convirtieron en una de sus bases industriales externas. Sin embargo, el lugar ocupado en la economía mundial por China y en mucho menor grado por la India no puede reducirse solamente a la ‘exportación’ de las relaciones de producción capitalista desde los países de la Tríada. Está basado en un proceso autóctono de acumulación impulsado por fuerzas sociales endógenas. Lo que distingue a tales “países continentes” de otros ‘grandes países emergentes’ a los que suele aproximárselos”.[3]

 

Es decir, la burguesía china habría aprovechado el impulso dado por las inversiones imperialistas para generar “un proceso autóctono de acumulación” que distingue al país de otros “emergentes”. En el mismo material, expresa que si bien los EE.UU, están en el origen de los principales impulsos y fueron los arquitectos de su correspondiente régimen institucional, al trasladar los capitales hacia China, para combatir la caída de la tasa de ganancia, ayudaron a la emergencia de un rival al menos potencial”. Una tesis parecida es presentada por Perry Anderson, otro prestigioso intelectual marxista[4].

 

En otro artículo, Chesnay hace una analogía con el resultado negativo para el imperialismo de la invasión y la ocupación de Irak: ¿No ocurre algo análogo en lo que hace a la ayuda industrial y tecnológica masiva aportada a China, cuyo tamaño, cultura e instituciones estatales lo convierten en el único gran Estado capaz de de devenir un rival económico y militar directo de los Estados Unidos?”[5].

 

En otras palabras, como resultado de sus propias contradicciones y necesidades, el imperialismo habría ayudado a crear una “potencia autónoma” capaz de disputarle la hegemonía mundial no sólo en el terreno económico sino también en el político-militar.

 

A partir de estas definiciones, él caracteriza que el curso de la actual crisis y el de la economía mundial dependerán de lo que ocurra en el polo China-Asia:

 

“…el principal interrogante, del que realmente depende el curso de la crisis financiera, se refiere a Asia. Esta crisis financiera podría no desembocar en una crisis mundial grave del tipo de la de 1929, si no se produjera una desaceleración general de la demanda mundial que revelase que hubo -desde el 2002 y más aún luego de 2003- un proceso de sobre acumulación en todas las economías asiáticas de la costa del Pacífico (en China, pero también en Japón, Corea y Taiwán)”.(…)El análisis del movimiento de acumulación, de sus contradicciones y de su crisis debe hacerse concediendo todo su lugar al que tal vez ya sea, en la configuración actual, su piedra angular: China. (...) la crisis en gestación debe ser pensada en un marco donde Asia ha pasado a ser un componente esencial”.[6]

 

Es una variante de la teoría del “desbloqueo” sostenida por diversos economistas burgueses, que asignan a China y a otros países el posible rol de “motor alternativo” que “desbloquee” una parte de la economía mundial y así frene o amortigüe la crisis.     

 

China: gran semicolonia del imperialismo

 

Para refutar la tesis de China “gran potencia mundial” y sostener la caracterización que es una gigantesca semicolonia del imperialismo, vamos a recordar diversos elementos señalados en un artículo de Marxismo Vivo de varios años atrás[7]. En ese material, se analiza que la economía china crecía a tasas altísimas pero lo hacía desde un nivel muy bajo, propio un país atrasado:

 

“La forma en que se está dando ese crecimiento hace que China no sea una amenaza para las actuales potencias imperialistas. En realidad, no es siquiera una amenaza económica para los países más importantes de su área, los llamados ‘tigres asiáticos’. Mas aún, China no sólo no apunta a convertirse en una gran potencia económica, sino que, por el contrario, camina a pasos acelerados en dirección a una semicolonia del imperialismo, si es que ya no lo es”.

 

Ese crecimiento era, en gran medida, artificial y, por lo tanto, frágil e inestable, porque se apoyaba fundamentalmente “en cinco condiciones favorables pero de carácter sólo coyuntural (…) la apertura que existe en la mayoría de los mercados del mundo para los productos chinos baratos; la existencia de una dictadura que posibilita una superexplotación feroz; los incentivos a las empresas privadas apoyados en el ‘sacrificio’ de las empresas estatales; los salarios extremamente bajos, aun comparados con los países más atrasados del tercer mundo, y las importantes inversiones venidas del exterior”. La conclusión era que: “El crecimiento de la economía es tan frágil que bastaría que sólo uno de estos factores se modificase para que todos los restantes lo hagan y, de esta forma, el crecimiento se transforme en estancamiento o retroceso. Esta es la situación que se está aproximando”.

 

El crecimiento continuó

 

Han pasado casi 8 años y la economía china ha seguido creciendo. ¿Ese análisis estaba equivocado y ha tenido razón Chesnay sobre el “desarrollo autónomo” de China como “potencia”? Creemos que no: ese análisis era estructural y no coyuntural. En este sentido, la continuidad del crecimiento se explica porque las condiciones señaladas siguieron cumpliéndose. Incluso, algunas de ellas se acrecentaron, en el marco del ciclo de crecimiento económico mundial iniciado a finales de 2002, como las inversiones extranjeras y las posibilidades exportadoras.

 

En el período 1990-2000, las inversiones extranjeras tuvieron un promedio anual de poco más de 30.000 millones de dólares; posteriormente: 53.505 millones (2003); 60.630 (2004); 72.406 (2005) y 69.468 (2006). Actualmente, se estima que el stock acumulado de inversiones extranjeras representa un monto equivalente al 50% del PBI[8]. Veamos el siguiente cuadro de los países de origen y su porcentaje de la inversión total:

 

País                                        %                                          

Hong Kong                            29.75%

Islas Vírgenes                         14.96%

Japón                                      10.82%

Unión Europea                         8.61%

Corea del Sur                           8.57%

Estados Unidos                        5.07%

Singapur                                   3.65%

Taiwán                                     3.57%

Islas Caimán                             3.23%

Samoa Occidental                    2.24%

 

Más de 2/3 de las inversiones fueron al sector industrial y un 10% al sector inmobiliario[9]. Actualmente, 450 de las mayores compañías del mundo tienen inversiones en el país, al igual que otras millones de empresas de menor tamaño. Un “aluvión inversionista” que busca extraer directamente gigantescas masas de plusvalía. El propio Chesnay estima que “si consideramos el cuadro general en términos de masa y no de tasa, la mayor parte de la plusvalía que permite la reproducción del capital ahora proviene de Asia y sobre todo de China”[10].       

 

Con respecto a las exportaciones, en 2007, el país se ubicó en primer lugar en el mundo, superando ampliamente el billón de dólares. Más del 40% del PIB chino depende de esas exportaciones. El principal mercado son los EE.UU. hacia donde exportaron más de 300.000 millones de dólares. Sólo Wal Mart, que tiene una densa red de producción tercerizada en China, asegura el 10% de las ventas chinas en el exterior, la mayor parte a EE.UU.

 

Todos esos factores combinados (altas inversiones extranjeras, economía girada hacia las exportaciones, bajísimos salarios, extracción directa de una gran masa de plusvalía por las empresas imperialistas), al mismo tiempo que explican la continuidad de los altos índices de crecimiento, determinan una configuración típica no de una gran potencia sino de una economía semicolonial o, como mínimo, profundamente dependiente y dominada por el imperialismo.

El papel de China en la crisis

Definido el carácter semicolonial de China., la pregunta es si una economía de este tipo puede ser el “motor alternativo” de la economía mundial frente a una crisis económica mundial, con epicentro en EE.UU. Afirmamos categóricamente que no.

En las últimas décadas, su economía fue construida como una especie de gran “fábrica del mundo”, base de una parte muy importante de la masa de plusvalía extraída en  el planeta. Pero su economía es dependiente y subsidiaria de la  de EE.UU. Si la “locomotora principal” se frena, la “auxiliar” no podrá traccionar por sí sola el tren y, tarde o temprano, también se irá frenando.

Sin embargo, existe la hipótesis de que este proceso inevitable se dé en “dos tiempos”. Es posible que, en un primer tiempo, la crisis en EE.UU. y Europa provoque una nueva oleada de inversiones de capitales en China que busquen recuperar la tasa de ganancias, al mismo tiempo que los bajos precios de los productos industriales chinos les permitan competir con éxito en los mercados mundiales. De esta forma, en este primer período, la economía china se frenaría a un ritmo mucho menor que la estadounidense o la europea o hasta podría seguir creciendo a tasas altas. Pero, en un punto, comenzará a sufrir la reducción de la demanda mundial, especialmente de EE.UU., su principal comprador, y experimentará una crisis de superproducción.

Recordemos, además, que la lógica de las potencias imperialistas, a pesar de los “profundos cambios estructurales” que señalan Chesnay y otros, sigue siendo la de descargar la crisis sobre los países más débiles, a través de diversos mecanismos. Por eso, China no sólo no puede transformarse en la “locomotora principal” sino que, en este “segundo tiempo”, sufrirá con muchísima mayor dureza las consecuencias de la crisis mundial. Y arrastrará violentamente consigo a aquellos países que, como Brasil y Argentina, basan gran parte de su bonanza actual en la venta a China-India-Asia de alimentos, minerales y otras materias primas.

Un debate que debe continuarse

Existen otros aspectos de este debate que no vamos a profundizar pero sí queremos señalarlos. Si el sistema capitalista imperialista fue capaz de transformar el atrasado estado obrero chino en una gran potencia mundial, eso significa que habría demostrado ser superior al sistema de la economía estatal planificada. Más aún, eso significaría que, en última instancia, todavía puede jugar un papel progresivo ya que, aunque de modo distorsionado y deformado, aún tiene condiciones de desarrollar las fuerzas productivas.            

V. Las perspectivas

 

Resulta claro que los 600.000 millones de dólares que los bancos centrales de los países imperialistas gastaron el año pasado después del reventón de la burbuja inmobiliaria, más el dinero que siguen inyectando en los mercados[11], y la fuerte rebaja de la tasa interbancaria de la Fed, aunque evitaron la caída de algunas instituciones financieras y una “corrida” generalizada, no lograron revertir la dinámica recesiva del proceso.

 

Este hecho muestra que no se trata sólo de una “crisis financiera” como afirma Chesnay. También evidencia que el proceso ha llegado a un punto en que estas “inyecciones financieras” actúan sólo como un medicamento para el dolor superficial frente a un paciente que padece una enfermedad grave, que no hará más que avanzar. Se trata entonces de ir precisando sus ritmos y la profundidad que va a alcanzar, en un seguimiento de la coyuntura y el proceso en su conjunto.

 

La perspectiva de un crack financiero mundial y el inicio de una fase descendente profunda están planteados no sólo por las contradicciones estructurales del capitalismo, sino por el agravamiento de estas contradicciones y las profundas deformaciones que el sistema económico mundial desarrolla de forma creciente. No es casual que Stitglitz y Krugman hablen de “la peor crisis desde 1929”.

 

La “quema” de capitales requerida por la actual situación es muy grande no sólo porque la crisis de 2001-2002 fue “cortada” a mitad de camino en ese proceso sino porque, desde entonces, el volumen global de capitales en el mundo ha crecido geométricamente. La caída de los grandes bancos inmobiliarios y de inversión en EE.UU. muestra que la “quema” ya ha comenzado en ese sector. Pero este proceso debe profundizarse mucho más y afectar con bastante dureza también al “sector productivo” que venía siendo sostenido, en gran medida, por esos capitales especulativos y ficticios. Este es, entonces, uno de los rasgos propios de esta crisis: la necesidad de quemar un volumen gigantesco de capitales.    

 

Como hemos visto al analizar la situación de China, es posible que este proceso se dé en “dos tiempos”, que primero en que se frene y caiga EE.UU. (lo que ya parece estar sucediendo), pero que China aún mantenga cierto impulso, para luego frenarse también. En este caso, habría un fin de la fase ascendente de la “montaña rusa” pero, en lugar de una caída abrupta, tendríamos inicialmente una caída más suave y amortiguada que luego se acentuaría en sus ritmos.  La otra hipótesis es que el eje China-Asia se pare de modo más abrupto y la crisis generalizada explote mucho más rápidamente.        

 

En cualquiera de los casos, algo es totalmente seguro: el peso central de la crisis, o el costo necesario para intentar demorarla, será descargado por el imperialismo y los gobiernos, tanto de los países centrales como sus lacayos de los países más débiles, sobre las espaldas de los trabajadores y los pueblos de todo el mundo. En realidad, eso ya está sucediendo.

 

VI. Las consecuencias de la crisis para los trabajadores y las masas

 

Para los trabajadores y las masas, la crisis ya ha dejado de ser sólo un objeto de discusión general o una perspectiva futura. Ella ya está golpeando duramente sobre su nivel de vida. Si como marxista siempre marcamos la diferencia entre la “economía en general” (los análisis macroeconómicos) y la economía de los hogares obreros y populares. Veamos, entonces como se está produciendo ese impacto.

 

La “crisis de los alimentos”

 

En el dossier de Marxismo Vivo 18, analizamos los procesos más profundos del capitalismo imperialista que están en la base del aumento de los precios de la comida (que ya venía produciéndose en los años de crecimiento económico) y  la actual “crisis de los alimentos” (aumento de la renta agraria, centralización de capitales y existencia de mercados oligopólicos, desarrollo del agronegocio, etc.) por lo que no nos extenderemos. Aquí vamos a ver cómo la crisis económica agravó ese proceso y cómo el aumento de los precios ya representa una dura consecuencia de esta crisis para los trabajadores y las masas.

 

Frente a la perspectiva de una crisis económica internacional, sería lógico que los precios de los alimentos (y los de las materias primas en general) tendieran a bajar. La realidad, sin embargo, fue la opuesta: desde la “pinchadura” de la burbuja inmobiliaria en EE.UU., se dispararon a una velocidad muy superior.

 

Esta contradicción se explica por dos razones. La primera es de carácter coyuntural: una parte de los capitales que antes especulaban en el mercado inmobiliario ahora han girado hacia los commodities, especialmente petróleo y granos, creando así una "burbuja especulativa" que aumenta artificialmente su demanda y sus precios. En los últimos nueve meses de 2007, el volumen de capitales invertidos en los mercados agrícolas se quintuplicó en la UE y se multiplicó por siete en Estados Unidos[12]. Según la consultora Lehman Brothers, en esos meses, entre 150.000 y 270.000 millones de dólares fueron a especular con los precios “a futuro” de las materias primas agrícolas y otros 40.000 se sumaron durante el primer trimestre de 2008[13].

 

Si bien la tendencia histórica de los precios de los commodities depende de la relación entre producción y demanda totales del mundo, los mercados internacionales operan sobre la base de la fracción que se mueve en el comercio exterior (en el caso de los cereales, entre un 15 y un 20% del total). Por eso, un súbito aumento en esa demanda específica, originado en la llegada de estos capitales especulativos, puede provocar un fuerte aumento coyuntural de los precios que incidirá también sobre todas las otras operaciones. Se acentúa así el carácter de "casino de apuestas" que ya había adquirido el mercado mundial de alimentos con el sistema de "contratos a futuro". Algo similar ocurre en el mercado petrolero.  

 

Agreguemos que esta “crisis de los alimentos” se produce (tal como analizamos en el artículo de Marxismo Vivo) luego que decenas o cientos de millones de familias de pequeños campesinos han sido expulsados de sus tierras por el agronegocio. Eso significa que esas familias (incluso los parientes que habían ido a trabajar como proletarios o cuentapropistas en las ciudades) ya no tienen, como en el pasado, esa parcela de tierra como “retaguardia” para asegurarse, al menos, una base mínima de alimentación.

 

La inflación

 

La segunda razón es mucho más profunda. El aumento del precio de los alimentos y commodities desata lo que los economistas burgueses llaman “puja por los precios relativos”. Es decir, una pelea por la masa de plusvalía extraída que, como resultado de la crisis, comienza a decrecer. Por un lado, esta “puja” representa una pelea interburguesa.

 

De esta forma, a diferencia de otras crisis que provocan deflación (caída de precios), otro rasgo propio de la crisis actual es que origina, a la vez, estancamiento económico e inflación, lo que se ha llamada “estanflación”.  Una situación que, con distintos niveles, ya comienza a afectar a la mayoría de los países. 

 

Por el otro, es esencialmente un ataque a los  trabajadores y las masas, una de las formas en que las burguesías nacionales e imperialistas intentan descargar sobre los trabajadores el costo de la crisis económica.  La suba de precios de los alimentos y combustibles, y la inflación en general, disminuyen el valor real de los salarios pagados a los trabajadores, ya que los trabajadores pueden comprar menos con ese salario. La burguesía consigue así un aumento tanto de la tasa de explotación como de la masa de plusvalía real extraída en un intento de atenuar la caída de la tasa de ganancia que está en la base de la crisis económica.

 

Es necesario destacar que la inflación golpea con mucha mayor dureza a los sectores asalariados, especialmente los de menores ingresos. En primer lugar, porque los reajustes salariales vienen “después” de que se produjo la inflación con lo cual, incluso en un sistema de reajuste periódico, el salario cobrado siempre queda “retrasado” con respecto al aumento de precios. En segundo lugar, En segundo lugar, porque el aumento de precios de productos básicos como los alimentos o los combustibles impactan en una proporción mayor a los sectores de salarios bajos, por la mayor proporción que representan en sus gastos. Por ejemplo, una de las instituciones que mide la inflación en San Pablo, calculó que, en los primeros 6 meses de 2008, la inflación general había sido de casi el 6%. Pero que el aumento promedio de los alimentos fue del 20% lo que significaba que los gastos de una familia que recibía un ingreso de entre 1 y 3 salario mínimos (la gran mayoría de la clase obrera paulista) habían subido realmente un 8%. Es decir, más de un tercio por arriba del promedio “general” de la inflación.

 

Otro elemento que ya comienza a golpear, de modo aún incipiente  a los trabajadores es el fantasma del desempleo, como ya hemos visto en los datos que dimos de EE.UU. y de España. En la medida que la crisis avance y se desarrolle, este tema tenderá a gravarse cada vez más y tomar un peso creciente.

 

La deuda externa

 

En el período más reciente, después de la quita realizada por el gobierno de Kirchner en Argentina, el tema de la deuda externa, eje de las cuestiones político-económicas de las últimas décadas, pareció “desaparecer” un poco del centro de la escena. Esto se debió, por un lado, a que la situación favorable para la exportación y la buena situación de las balanzas comerciales permitió que varios países (como Argentina, Brasil o Venezuela) pudieran no sólo pagar puntualmente sino, incluso, adelantar pagos y así renegociar nuevos plazos para la deuda restante. Por el otro, a que una parte de esa deuda externa está siendo camuflada y “reciclada” como “deuda interna”.

 

Creemos este período de “calma” está cerca de terminarse. En primer lugar, porque a partir de 2009, en la mayoría de los países se acaba el “respiro” obtenido en las últimas renegociaciones. Por ejemplo, Argentina debería pagar, en los próximos 3 años, 47.000 millones de dólares. Ese es el marco de fondo de la puja del gobierno de Cristina con la patronal agraria por las “retenciones”. En segundo lugar, porque los holgados saldos de las balanzas comerciales por la buena situación exportadora tienden a achicarse, como ya se expresa en Brasil y Venezuela y se reducirán más a medida que avance la crisis.     

 

Esto se expresará en ataques a los trabajadores y las masas a través de los ajustes y recortes de los presupuesto sociales, baja de salarios de los empleados públicos, aumentos de la edad de jubilación, etc. Y estos nuevos ataques llegarán en un momento en que los sistemas públicos de salud, educación y previsionales están al borde del colapso, si es que ya no colapsaron (por ejemplo, el problema del dengue en Rio de Janeiro) como resultado de la combinación de los anteriores recortes y la privatización o semiprivatización de los servicios. Esto significa que el problema del pago de la deuda externa (e “interna”) se reabrirá con toda su fuerza a partir de 2009, con tanta o mayor fuerza que en décadas anteriores, como uno de los ejes de la lucha de las masas,

 

 

VII. Algunas conclusiones

 

De esta forma, para los trabajadores y las masas, la crisis no es algo abstracto o académico, sino que ya se expresó de modo contundente en su realidad cotidiana, a través de la disminución de la cantidad y calidad de alimentos que pueden comprar, en el aumento del precio de los combustibles y la energía o, directamente, en la imposibilidad de acceder a una mínima cantidad necesaria para la subsistencia. En pocos meses, 200 millones de personas se han sumado a la lista de los sufren hambre y en 33 países se produjeron “revueltas de hambrientos”. Ésta es la contraparte necesaria de las fabulosas y crecientes ganancias de los “dueños de los alimentos”. Una nueva y terrible expresión de la ley de la miseria creciente enunciada por Marx.

 

Luego de haber anunciado su “triunfo definitivo” en la década de 1990, el capitalismo imperialista vuelve a mostrar que no puede solucionar la pobreza, el desempleo y el hambre en el mundo porque es el mismo sistema, y sus leyes de funcionamiento, los que lo crean y se benefician con ellos. Si el crecimiento económico de las últimas dos décadas, a diferencia del boom 45-73, se hizo sobre la base de la acentuación la desigualdad social, la actual crisis ya genera situaciones insoportables para los trabajadores y las masas.

 

Aquí entra un factor central para definir cualquier perspectiva económica y las posibilidades del capitalismo imperialista de atenuar la crisis o salir de ella: la lucha de clases. En este terreno, la situación no parece muy auspiciosa para el imperialismo. A la resistencia de las masas de Medio Oriente, debemos agregar la resistencia constante de las masas latinoamericanas al saqueo y la explotación y las luchas de los trabajadores europeos contra los ataques de sus gobiernos y patronales. En los propios EE.UU., se avizora la posibilidad de un ascenso obrero. Finalmente, como la expresión más reciente y espectacular de la resistencia de las masas, vimos la “rebelión de los hambrientos” en los países más pobres de la tierra.

 

Es posible, entonces, que los ataques que el capitalismo imperialista comienza a descargar sobre los trabajadores y los pueblos agreguen más “leña al fuego” de esta luchas. Pero esta posibilidad no está garantizada de antemano. Tal como analizaba Trotsky, luego del crack de 1929, las crisis económicas también pueden impactar negativamente sobre la clase obrera, debilitando su capacidad de lucha o dividiéndola, más aún con la profunda crisis de dirección revolucionaria existente. En cualquier caso, es una batalla que ya está abriendo.       

 

Para finalizar este material, consideramos que sería un error “economista” terminarlo con el desarrollo de una propuesta programática, ya que casi no hemos considerado los problemas políticos y de relación de fuerzas entre las clases. Sin embargo, queremos formular dos aspectos generales que creemos deben estar presentes en esa respuesta.

 

El primero es que la crisis económica y, de modo especial, la “crisis de los alimentos” ofrecen una excelente oportunidad para desarrollar una fuerte y amplia propaganda contra el capitalismo imperialista. La superación de la pobreza, el desempleo y el hambre sólo podrá alcanzarse con su destrucción y su reemplazo por un sistema de economía central planificada, que utilice racionalmente los recursos existentes y se organice al servicio de satisfacer las necesidades básicas de los trabajadores y los pueblos del mundo. La necesidad urgente de la revolución socialista se reafirma cada vez más.

 

El segundo es que, combinado con esa propaganda, es necesario formular programas concretos de transición, adaptado de modo específico a la situación de cada país, que den respuesta a las necesidades inmediatas de los trabajadores y las masas (luchar contra el hambre, el desempleo, la miseria, la muerte por enfermedades fácilmente curables) y que impulsen su movilización unificada. La clase obrera y las masas del mundo no pueden esperar pasivamente frente a esta realidad: tienen que luchar por su supervivencia física. Es imprescindible que la clase obrera se ponga al frente de todas las masas empobrecidas para encabezar esta lucha.

 

21/7/2008



[1] Pablo Rieznik, Catastrofismo, forma y contenido, en www.po.org.ar, 20/11/2007. 
[2] Nombre que recibió la ideología de las sectas cristianas medievales que afirmaban que el mundo terminaría el año  1000 dC.
[3] El fin de un ciclo, reproducido en español por la revista SinMuro No 29, 4/4/2008. 
[4] Apuntes sobre la coyuntura internacional, New Left Review, en www.newleftreview.org.
[5] Tres ideas que pueden ayudar a pensar este momento histórico, en la revista Herramienta, 16/4/2007.
[6] El fin de un ciclo.
[7] China, mito y realidad, Martín Hernández, Marxismo Vivo No 2, octubre de 2000.
[8] World Investment Report 2007, United Nations Conference on Trade and Development.
[9] Fuente: Oficina Económico Comercial de España en Pekín, “Informe Económico y Comercial China”, julio 2006.
[10] El fin de un ciclo.
[11] La Reserva Federal anunció que aumentará a 100.000 millones de dólares el dinero que pondrá a disposición de los bancos este mes en subastas especiales, como un mecanismo para elevar la liquidez en los mercados de crédito”  (Agencia EFE. 8/3/2008).
[12] Estalla el precio de los cereales de Domique Baillard, Le Monde Diplomatique, edición mayo 2008.
[13] Citado en el artículo La burbuja alimentaria de Andreu Marti, Argenpress, 2/6/2008.